Damos uma olhada por dentro da CCXP, concorrente brasileira da Comic-Con
Cada vez que a CCXP começa, quase todo mundo em São Paulo sente isso. Uma viagem de 40 minutos até o centro de convenções São Paulo Expo pode de repente levar três horas com trânsito. Alguns participantes viajam mais de 1.800 milhas para assistir ao maior número possível de painéis no evento de entretenimento e quadrinhos. Em 2023, os fãs entraram na fila com um dia inteiro de antecedência para conhecer o mangaká de terror Junji Ito, apesar de ele estar presente nos quatro dias de show.
“O impacto econômico do turismo no estado de São Paulo é notável”, disse a YouTuber Regina Vieira ao Polygon por e-mail. “Cometi o erro (de reservar meu hotel em 2023) tarde demais e a maioria das acomodações de hotéis conhecidas perto do bairro estavam lotadas.”
Vieira também percebeu que todos os painéis a que comparecia estavam com lotação máxima e os fãs muitas vezes gritavam, riam alto e dançavam ao som da música de fundo. “Sinto que a CCXP é mais do que um evento”, diz ela. “Para alguém que só ia a eventos menores, como eu, foi chocante ver tanta devoção – e posso dizer também estressante porque havia filas para a maioria das coisas ali.”
Para o grupo por trás da CCXP, Omelete Company, alcançar e manter esse status não foi tarefa fácil. Questões como inflação e disparidade econômica são obstáculos naturais para receber hóspedes internacionais que tendem a voar em primeira classe, pagar seguros e garantias para enviar equipamentos para painéis e reservar quartos de hotéis cinco estrelas.
A primeira edição da CCXP foi realizada em dezembro de 2014 em São Paulo. Originalmente apenas um meio de comunicação, a Omelete fez parceria com as empresas locais Piziitoys e Chiaroscuro Studios para itens colecionáveis e histórias em quadrinhos, respectivamente. As apostas eram altas. Segundo Roberto Fabri, vice-presidente de conteúdo da CCXP, se a primeira edição não correspondesse às expectativas, a empresa teria falido.
Uma década depois, a CCXP realizou convenções no Brasil, Alemanha e México. Enquanto a CCXP Colônia foi colocada em espera devido à pandemia de COVID-19 e à guerra Rússia-Ucrânia dificultando a operação na Europa, o cronograma atual — Brasil em dezembro e México em maio — permite que a equipe antecipe os lançamentos de inverno e verão em ambos os hemisférios Norte e Sul. Garante também um público maior, abrangendo tanto a língua portuguesa quanto a espanhola.
Gabi Orsini já esteve em todas as CCXP do Brasil, tanto como fã quanto como jornalista. Ela ainda estava na faculdade quando aconteceu a convenção de 2014 e viu nisso uma oportunidade de cobrir um evento a título profissional pela primeira vez. Ela diz que sempre foi seu sonho participar da Comic-Con em San Diego e Nova York. “Quando eles começaram com esse (evento de cultura pop) no Brasil, eu fiquei tipo, OK, esta é minha chance. Eu posso viver o sonho. E meu trabalho me permite ir sem pagar a passagem”, diz Orsini.
Além dos números de bilheteria internacionais – De dentro para fora 2 arrecadado US$ 102,2 milhões no México e US$ 80 milhões no Brasil — Fabri atribui o interesse de Hollywood na América Latina ao alto uso das mídias sociais, bem como ao potencial das multidões para entregar respostas altas durante os painéis. “Já participei de alguns painéis em San Diego, e às vezes eles tinham, não sei, Tom Cruise no palco, e os americanos batiam palmas como num teatro ou numa ópera”, diz Fabri. “No Brasil, você diz: ‘Este é o dublador do anime X’, e parece a Copa do Mundo.”
Apesar disso, à medida que o evento se aproxima do seu 10º aniversário, o próximo acontecerá de 5 a 8 de dezembro em São Paulo, o necessidades da equipe para novas fontes de receita e patrocinadores para cobrir despesas aumentaram, segundo reportagem do Valor Econômico, já que os custos “dobraram no período pós-pandemia devido à alta taxa de câmbio e aos preços dos combustíveis”. A edição do México ajudou nesse sentido — o voo de Los Angeles leva cerca de três horas, em vez de mais de 10 horas para o Brasil, e a equipe não precisa pagar impostos para enviar equipamentos como projetores e sistemas de som do país. EUA Mas a descoberta tem sido um problema, especialmente quando se embarca num país pela primeira vez.
A empresa também deixou de chamar o evento de “Comic Con Experience” e optou por uma renomeação geral para CCXP a partir de 2019, abandonando as marcas “Comic Con Experience” e “Comic Con Experience São Paulo” após 2018, e mantendo apenas “CCXP, ”“CCXP SP” e “CCXP Unlock” desde então. Essa mudança veio da intenção de solidificar a marca CCXP e evitar problemas de marca à medida que o evento crescesse, afirma Fabri. “No início, as pessoas pensavam, O que é CCXP? Por que Brasil? E nós pensamos, Ah, porque temos uma comunidade forte e não temos nenhum tipo de comic con no Brasil”, diz ele. “No início ajuda a se conectar com a ideia do evento que você deseja realizar.”
Segundo Fabri, ninguém de San Diego procurou a equipe por usar o nome “Comic Con” porque “comic con é um tipo de evento e não uma marca em si”, afirma. Durante os primeiros anos, o evento tinha um logotipo diferente que parecia um cubo de Rubik com “Comic Con Experience” escrito. “Ninguém sabe que o logotipo do Cubo de Rubik é uma marca registrada”, diz ele. “Nós estávamos tipo, É melhor parar de usar isso, caso contrário teremos problemas.” (Em 2017, um júri em San Diego decidiu a favor da Comic-Con International que detém a marca registrada do termo “comic con” como descritor para um evento de fãs de cultura pop.)
O Brasil já conhece bem o que é CCXP, mas o processo de integração não foi tão tranquilo para a primeira edição do México. No início de 2024, as placas de marketing em torno da Cidade do México – primeiro aparecendo principalmente em ônibus e depois como banners maiores pela própria cidade – exibiam apenas o logotipo. Segundo o criador de conteúdo Dave Villareal, quem não conhece a marca não sabe dizer que a CCXP tem relação com um evento de cultura pop. À medida que o evento se aproximava, houve um impulso de marketing mais forte nas redes sociais, onde o interesse aumentou, com a campanha a apresentar a próxima convenção como “o maior evento de cultura geek” do país.
Outro problema durante a preparação para o evento foi a falta de anúncios formais de convidados e painéis até menos de um mês antes do início. Villareal percebeu um baixo comparecimento (56 mil pessoas compareceram à CCXP México, segundo Fabri, em comparação com 287 mil participantes da CCXP Brasil 2023, segundo comunicado à imprensa), o que ele atribui à falta de detalhes associados ao custo dos ingressos.
“Talvez em outros países com mais dinheiro, seja nos EUA ou no Reino Unido, onde eventos deste porte são mais comuns, seja mais comum anunciar artistas um mês antes”, diz Villareal. “Mas isso não funciona da mesma forma no México. As pessoas na América Latina precisam economizar dinheiro para essas coisas.”
Os passes de um dia eram vendidos por cerca de 1.300 pesos mexicanos, ou cerca de US$ 65 hoje. No momento da publicação, o salário mínimo no México está entre 5.000 e 6.000 pesos por mês, ou cerca de US$ 250 a US$ 300. Além das passagens, as pessoas precisam contabilizar viagens e hospedagem. Depois de instalada, diz Villareal, o meio de transporte mais comum na Cidade do México é o metrô, mas o local da CCXP ficava longe do centro da cidade e não há estação próxima. As pessoas acabavam dirigindo ou pegando táxis, este último aumentando rapidamente o custo total. Villareal, que compareceu aos três dias, bem como a uma noite de pré-estreia apenas para convidados, gastou cerca de US$ 30 por dia.
“Pelo menos no México não estamos acostumados com um preço tão alto por um evento”, diz ele, ao mesmo tempo em que observa a desorganização da equipe do evento, que, segundo ele, não tinha certeza do horário quando questionado sobre orientações, como a fila adequada. para conseguir um autógrafo ou foto com talento. E ele diz que, em média, as pessoas tinham que chegar uma hora antes de cada painel para garantir uma vaga. “Hoje, depois de participar do evento, posso dizer que vale a pena apenas um dia, que é o suficiente para ver tudo.”
“Acredito que a CCXP é uma porta de entrada para eventos internacionais na América Latina. Talvez não seja exatamente como a Comic-Con de San Diego, mas nós, como latinos, precisamos estar à vista desses eventos”.
Vieira ecoa sentimento semelhante em relação aos preços dos ingressos para a CCXP Brasil. Em 2023, um passe de quatro dias custava 1.800 reais (cerca de US$ 300 hoje), enquanto o salário mínimo é de 1.412 reais por mês. E em 2024, os fãs tiveram outro evento para orçar – a Disney sediou seu evento para fãs D23 no Brasil de 8 a 10 de novembro. X (anteriormente conhecido como Twitter), bem como respostas para a conta do Instagram da Disney Brasil, passes de três dias foram vendidos em um dia no dia 14 de junho, apesar de a Disney não ter anunciado convidados ou painéis. “As pessoas só queriam estar lá”, diz ela. “Eles não se importavam com quem aparecia ou se alguém iria aparecer.”
Embora as pessoas entrevistadas para esta matéria concordem que a Disney iniciar seu próprio evento no Brasil é, em última análise, bom para a região, demonstrando interesse e um aumento de relevância internacionalmente, ele não gerou o mesmo tipo de manchetes que o D3 2024 em Anaheim, Califórnia, que incluiu o trailer de estreia de da Disney Branca de Nevea revelação de Incríveis 3imagens exclusivas no quarto de Demolidor: Nascido de Novoe outros anúncios. Referindo-se à CCXP, Orsini diz que cada estande tende a ter uma atividade da qual participar – substitutos de fotos, questionários e jogos para ganhar prêmios, salas de fuga e assim por diante. O foco do D23 parecia ser menos na experiência e mais na venda de mercadorias oficiais.
“O D23 tem muito potencial para fazer algo grande e memorável aqui”, disse o criador de conteúdo Felipe Basttianon por e-mail. “Com a Marvel, muitos fãs de quadrinhos e cultura pop com certeza terão opiniões divididas na compra de ingressos para CCXP e D23. Em 2023, o estande da Disney na CCXP não teve ativações para brindes e teve como foco principal as vendas de pelúcias e Lego da marca.”
Questionado se a equipe já pensou em sediar o evento nos EUA, Fabri diz que houve “conversas muito fortes” ao longo dos anos com cidades que têm grandes populações latino-americanas. Por enquanto, concretizar isso ainda é um “sonho” da equipe, e não uma prioridade no momento — e julho estaria fora de questão, já que não querem disputar a Comic-Con de San Diego.
Como Brasil e México continuam sendo o foco principal, os fãs continuam apostando no crescimento da CCXP na região. Poder ver os atores pessoalmente sem a necessidade de viajar internacionalmente continua sendo uma novidade. Mas à medida que os preços continuam a subir e novos eventos como o D23 estão a chegar à América Latina, as empresas que anunciam convidados e horários com prazo suficiente podem percorrer um longo caminho.
“Minha esperança para a próxima vez (no México) é que a CCXP anuncie os artistas pelo menos dois meses antes do evento”, diz Villareal. “Considerando como eles o comercializaram como o maior evento de cultura geek, estava bastante vazio. Dava para perceber que muitas pessoas não queriam pagar pelas passagens, porque conheço meu país e tenho certeza de que deve ter parecido extremamente caro para a maioria.”
Mesmo assim, mesmo desejando que a CCXP tenha mais anúncios importantes para atrair a atenção internacional, Vieira acha gratificante que atores e diretores de Hollywood visitem a região, experimentem a comida brasileira, visitem pontos turísticos e tentem falar um pouco de português durante os painéis . “Acredito que a CCXP seja uma porta de entrada para eventos internacionais na América Latina”, afirma. “Talvez não seja exatamente como a Comic-Con de San Diego, mas nós, como latinos, precisamos estar à vista desses eventos. Somos numerosos nas redes sociais e temos um grande número de fãs, então por que não tentar nos conectar com esses fãs?”